terça-feira, 4 de agosto de 2009

Paz, amor e IRA


Revista VejaEdição 1 638 - 1°/3/2000

Inglaterra
Paz, amor e IRA
Ex-espião inglês diz que John Lennon deu dinheiro a terroristas da Irlanda
Enquanto o mundo pegava fogo, com guerras pipocando por todos os lados, o cantor inglês John Lennon dizia que a humanidade precisava apenas de amor e pedia que fosse dada uma chance à paz. Melhor ainda, fazia isso por meio de músicas belíssimas, que passariam à posteridade como hinos de uma época. Mas uma história que veio à tona na semana passada em nada combina com a fama de pacifista do ex-beatle: segundo um ex-agente do serviço secreto inglês, Lennon teria colaborado financeiramente com o Exército Republicano Irlandês, IRA, o sanguinolento grupo terrorista que luta contra a ocupação britânica da Irlanda do Norte.
David Shayler, um antigo espião inglês que vive na França e tem uma tremenda língua solta quando se trata de segredos de Estado, afirmou ter visto em 1993 documentos que indicam o envolvimento de Lennon com o IRA. Mais: o ex-beatle, assassinado por um desequilibrado mental em 1980, teria dado apoio ao Partido Revolucionário dos Trabalhadores, uma organização radical de esquerda. Os papéis fariam parte do arquivo que o FBI, a polícia federal americana, mantém sobre o cantor nos Estados Unidos, com informações enviadas por Londres depois que Lennon se mudou para Nova York, em 1971. São exatamente esses documentos que John Wiener, professor da Universidade da Califórnia, quer ver abertos ao público, objetivo que acaba de ganhar um empurrãozinho. Um juiz lhe deu acesso ao material. O FBI tem um mês para recorrer da decisão.
Indignada, a viúva de Lennon, Yoko Ono, declarou que o ex-beatle enviou dinheiro à Irlanda do Norte, sim, mas apenas para ajudar crianças e a comunidade afetada pela violência política. Há quem acredite que os recursos podem ter sido desviados para a compra de armas pelo IRA sem o conhecimento do cantor. O próprio Wiener, que deseja escarafunchar os documentos do FBI, diz que é difícil acreditar no envolvimento direto de Lennon com a luta armada. A opinião não é compartilhada por Hunter Davies, biógrafo dos Beatles. Ele disse que não ficaria totalmente surpreso se a história do espião fosse confirmada. "John gostava de agitar", afirmou. Um porta-voz do Sinn Fein, o braço político do IRA, pôs mais lenha na fogueira ao concordar que o envolvimento de Lennon com o grupo "não era impossível".
A simpatia do ex-beatle pelos republicanos irlandeses não é segredo. Depois que treze civis foram mortos por tropas inglesas em Londonderry, em 1972, no chamado Domingo Sangrento, Lennon foi claro: "Entre o IRA e o Exército britânico, eu fico com o IRA". Já antes, no final da década de 60, ele não escondia a revolta com várias atitudes do governo de seu país, como o apoio de Londres à intervenção americana no Vietnã e às forças que combatiam impiedosamente a separatista Biafra, na Nigéria. Mas existe uma distância imensurável entre se posicionar a favor de determinadas causas e financiar terroristas. Até agora, a polêmica só serviu para reafirmar que, há três décadas, mesmo um pacifista tinha de tomar partido num mundo dividido por balas, bombas e napalm

Nenhum comentário:

Postar um comentário